domingo, 13 de junho de 2010

“É uma estatua viva que em que a gente pode escrever e participar”







Inicialmente pensei em re-fazer a performance de Sophie Calle, em que ela segue pessoas até terminar seguindo apenas um homem por um tempo considerável. Me convenci de que essa seria uma performance interessante porque em si já era uma espécie de re-enactment de Following Piece , de Vito Acconti. Fiz algumas tentativas, fracassadas, de seguir pessoas diferentes.

Após essas tentativas, decidi re-criar Peça-Mapa, originalmente feita por Yoko Ono no verão de 1962. Essa performance, por sua vez, consistia em distribuir cartões com as seguintes instruções:

Desenhe um mapa imaginário

Coloque um ponto no mapa onde você queira ir.

Vá andando em uma rua de verdade segundo o seu mapa.

Se não houver rua onde deveria, segundo o mapa, faça uma colocando os obstáculos de lado.

Quando você atingir sua meta, pergunte o nome da cidade e dê flores para a primeira pessoa que encontrar.

O mapa deve ser seguido a risca, ou a ação terá de ser cancelada por inteira.

Peça a seus amigos que façam mapas.

Dê mapas a seus amigos.

Nesse caso, o que mais me interessava era a idéia de que qualquer um pode ser o artista de seu mapa imaginário, de sua Passárgada.

Acho que, durante o curso, as idéias de vários dos alunos foram mudando. A minha certamente foi. Após ler o texto sobre estética relacional, me dei conta de que as duas performances que eu havia escolhido continham o mínimo possível de relação com o “público”. Percebi que estava escolhendo ações onde eu me exporia muito pouco ou nada. E que essas escolhas estavam diretamente relacionadas à minha personalidade.

Foi muito impactante para mim ouvir o relato do re-enactment de Cut Piece, realizado por 4 colegas de classe. No original, a performance era quase um protesto contra a guerra do Vietnã, também realizada por Yoku Ono. Ela estava com um vestido, em um palco de Tókio, e as pessoas aproximavam-se dela para cortar-lhe um pedaço da roupa. Qual seria a importância da mesma performance, deslocada para um ambiente universitário, carioca, em 2010? Da primeira vez que meu grupo de amigos tentou refazê-la, ela se tornou um atestado a respeito da violência do homem. Mas o que mais me chamou atenção foi o quanto essa, e outras performances relatadas depois em sala, foram importantes para quem as estava fazendo. O quanto fazer uma performance pode mudar uma pessoa. Será que eu seria mudada, executando ações em que eu estava tão bem escondida de todos?

O resultado de Cut Piece do Cláudio, da Vanessa, da Rany e da Tatiane foi violento e carregado de conotação sexual. Em seu relatório, Vanessa compara: A força que tem refazer Cut Piece hoje é mostrar que se algo modificou, foi para pior. Uma violência gratuita quase animalesca muito presente no ser humano. Mesmo após refazer a mesma performance em um ambiente diferente (A livraria da Travessa, durante o lançamento do livro da professora Tânia Alice), Cláudio escreve que para ele ficaram 5 questões, uma delas : 3- A sexualidade sempre ligada ao corpo do artista

Levando em conta todas as considerações acima, decidi fazer um re-encatement do re-enactmente de meus colegas. Em primeiro lugar, sabia que me expor seria um grande desafio pessoal. Depois, queria testar o quanto podemos dar novo significado a uma performance. Sem esquecer a idéia de Peça Mapa, quis mostrar um Cut Piece onde o foco seria transformar aqueles que passassem por mim em artistas, tendo a mim como matéria prima.

Para mudar o foco, mudei um pouco a performance. Em primeiro lugar, não estava sentada, mas de pé sobre um pequeno banquinho. Queria ser vista como uma estátua, ou quem sabe o mármore esperando ser esculpido. Depois, além de ter a tesoura na mão, tinha também canetas de todas as cores, e um vestido liso e claro. Queria me comunicar com as pessoas, mas de uma maneira diferente, por isso me impus a regra de não dizer nada. A ação foi realizada em frente ao cinema Artplex em botafogo em uma tarde de domingo. Um dos aspectos interessantes a respeito da escolha da localização é que, ao lado do Artplex, há um PontoFrio. Assim, as pessoas que passavam por lá eram as mais variadas, das mais variadas faixas etárias e classes sociais. Comecei as 17:30 horas.

Muitas pessoas passavam por mim. Eu tinha um copo na mão com a tesoura e as canetas. Se me olhassem, inclinava o copo, em um convite para que participassem. A essa reação tive várias respostas. Pessoas que se envergonhavam de terem sido “Pegas” olhando. Outras se aproximavam, faziam perguntas e depois iam embora. (“você está com frio?”, “Está vendendo as canetas?”, “isso é um trote de faculdade?”). Finalmente, alguns começaram a escrever em mim. Primeiro jovens, que queriam escrever algo forte, pareciam de uma classe mais alta. Depois, outras pessoas foram entrando no clima da brincadeira. Um passou por mim, sem se aproximar, exclamando a frase que usei para titulo. Alguns foram mais marcantes do que outros. O pipoqueiro; Um sujeito mais ou menos da minha idade que escreveu “você é Linda. Boa sorte!!!”, depois me mandou beijinhos e me disse seu número de telefone; Duas crianças; Uma senhora bem humilde, que entrou com gosto no jogo e além de desenhar, cortou bolinhas na barra do meu vestido.

Tive, de maneira geral, respostas muito positivas. Muitos me agradeceram por estar ali. Fiquei alegremente surpresa. Foi interessante perceber que, as pessoas mais jovens e de classe mais alta que iam ao cinema, se preocupavam muito com o que escrever. As mais humildes pareciam se divertir mais, desenhando qualquer coisa. Para mim a performance terminou quando um colega de faculdade, passando por ali, me deu um forte abraço, escreveu algo em minhas costas, depois me deu um beijo em cada bochecha e foi ao cinema. Claro que era uma pessoa que me conhecia. Assim como haviam pessoas que conheciam o Claudio, a Vanessa, a Rany e a Tatiane. Porém, ele demonstrou tanto carinho que pareceu provar algo que foi muito importante para mim: Talvez nem tudo tenha mudado para pior. Percebi também que talvez a reação as nossas ações estajam condicionadas ao que esperamos, e a como abordamos as pessoas. Abordei todos com um sorriso, mesmo que no inicio estivesse bastante temerosa e desconfortável. Ganhei em troca, da maior parte dos que passaram por ali, sorrisos.

Um comentário:

  1. Que performance linda! Seu relato foi muito cativante. Parabéns pela inicaitiva.

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