terça-feira, 21 de setembro de 2010
Entrevista de Marina Abramovic a Lynne Cook para o site da 28ª Bienal de São Paulo em 2008
ART MUST BE BEAUTIFUL, ARTIST MUST BE BEAUTIFUL [A arte deve ser bela, o artista deve ser belo], 1975. Parte integrante da videoinstalação VIDEO PORTRAIT GALLERY [Vídeo galeria de retratos], 2007. Cortesia: artista & Sean Kelly Gallery, Nova York.
Lynne Cook: Como surgiu esta obra?
Marina Abramovic: Pensando em diferentes maneiras de atualizar material antigo e em como apresentar este material também de diferentes maneiras, descobri que havia muitas obras que tinham a ver com a minha cabeça. Ao editá-las, acabei chegando a uma versão moderna da Galeria de Retratos – exceto pelo fato de que, enquanto uma galeria de retratos tradicionalmente reúne um acervo de pinturas, a minha é eletrônica. A primeira vez que usei vídeo foi depois que deixei a Iugoslávia, com Artist Must Be Beautiful [O artista deve ser belo] (1975), cujo foco é minha cabeça. Daí para a frente, de alguma forma sempre estive me concentrando em diferentes partes do meu corpo: estômago, braços ou pernas… Quando comecei a editar essas obras, descobri que mostravam uma versão da minha vida: não apenas do desenvolvimento de minhas performances mas também do envelhecimento da artista na trajetória de trinta anos. Tenho duas obras em andamento: Video Portrait Gallery [Galeria de retratos em vídeo] e The Biography [A biografia], que comecei em 1987 depois de caminhar com Ulay ao longo da Grande Muralha da China. Continuo a editá-las a cada quatro ou cinco anos, à medida que coisas diferentes acontecem na minha vida.
Lynne Cook: Quem conhece seu trabalho sabe que cada monitor em Video Portrait Gallery serve, em parte, de aide-mémoire, relembrando a performance original mostrada aqui.
Marina Abramovic: Toda vez que olho para obras das décadas de 1970 e 1980 nas exposições de hoje elas me parecem muito tristes. Não é justo que a nova tecnologia tenha uma aparência tão melhor, mais bonita e mais atual: as obras antigas de alguma forma ainda perdem, mesmo que as idéias sejam dez vezes melhores. A minha grande pergunta é: será que o artista tem o direito de atualizar o material do seu passado, colocando-o em um contexto no qual talvez venha a ter uma nova vida?
Lynne Cook: Você incluiu cenas de Cleaning the Mirror [Limpando o espelho] (1995), em que lava ossos de um esqueleto. Pode-se perceber que o excerto que você mostra é a cabeça do esqueleto, e não a sua. Esse crânio fala ao futuro, na vida após a morte…
Marina Abramovic: Exatamente. Mandei minhas medidas para um especialista de uma faculdade de medicina na Alemanha, onde fazem esqueletos. Mesmo que não sejam ossos reais, são, metaforicamente, meu corpo.
Lynne Cook: Você parece pensar muito sobre a morte ultimamente.
Marina Abramovic: Minha mãe e minha tia morreram há exatamente um ano; assim como alguns amigos. Embora seja muito importante para mim, não penso sobre a morte em si, apenas sobre os horrores do funeral. Acho que se deve indicar como queremos ser vistos, eu quero ter controle sobre esse aspecto. Os sofistas diriam que a vida é um sonho, e que a morte é o acordar, mas o percurso entre as duas é muito importante. Como artistas, temos de saber não apenas como devemos viver, mas quando devemos parar de trabalhar e como morrer. Às vezes entramos em pânico porque não estamos produzindo. Talvez haja um momento na vida em que não se deve fazer nada.
Lynne Cook: Embora a maioria dos profissionais – como juízes e cientistas – se aposente quando atinge certa idade, o modelo ideal que culturalmente temos dos artistas é que quando mais velhos experimentam uma explosão final de criatividade – como Beethoven ou Monet. Parece pouco digno de um artista simplesmente decidir se aposentar aos 65 anos.
Marina Abramovic: É uma contradição tão grande. Quaisquer que sejam suas circunstâncias pessoais, a obra do artista tem de conseguir elevar o espírito.
Lynne Cook: Hoje, a imagem do artista como celebridade é ubíqua. Ao criar este auto-retrato ampliado você está deliberadamente brincando com essa expectativa?
Marina Abramovic: Minha geração nunca pensou nesse tipo de coisa: a idéia do artista como ícone começou na década de 1980. Ainda que eu nunca tenha me envolvido nisso antes, é a base para toda a idéia da Video Portrait Gallery e para a sua continuação.
Lynne Cooke é curadora do Dia Art Foundation desde 1991. Ela recentemente se tornou curadora-chefe do Reina Sofia em Madri.
PROJETOS - 28ª BIENAL DE SÃO PAULO
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